O problema maior do homem é que
ele não sofre apenas por coisas que ele realmente deveria sofrer, mas sofre
também, muito desnecessariamente, por coisas pelas quais não deveria sofrer. O poder
de imaginação do homem é um dom muito benéfico, mas muitas vezes é muito
mal-usado, como, por exemplo, na criação de ilusões e erros maiores ou menores,
além de coisas completamente fora da realidade. Muita energia é assim
desperdiçada, sem trazer benefício algum. Vejamos um bom exemplo disso:
Hoje, no meio da minha cotidiana
caminhada matinal, eu encontrei o Zé Vitor (descobri hoje o seu nome). Ele
vinha empurrando, ladeira acima, o seu carrinho de mão cheio de lixo
reciclável. Ao vê-lo parado no meio da subida – para descansar um pouco e tomar
um fôlego – acelerei o passo para encontrá-lo e assim ajudá-lo no resto da
ladeira. Neste espaço de tempo – antes de chegar junto a ele – vinha pensando
em como devia ser difícil a sua vida, como o mundo era injusto, etc. etc.
Ao parear-me com ele,
perguntei-lhe se aceitaria uma ajuda para chegar ao fim da penosa subida. Ele
sorrindo, olhando-me nos olhos, disse-me que já estava acostumado e que não
precisava de ajuda; que todos os dias ele fazia o mesmo percurso, para entregar
a sua mercadoria no depósito de lixo reciclável do bairro e ganhar o seu muito
suado dinheirinho. Como eu insisti muito, ele permitiu-me a ajuda.
Acontece que, ao iniciarmos a
nossa caminhada, surgiu uma boa prosa. Por isso, percorremos juntos um trecho
mais longo do caminho, dividindo o peso do carrinho, o que permitiu-me saber um
pouco mais da vida deste “pobre e miserável” irmão; assim pensava eu... Na
verdade, a pobreza é coisa de Deus, pois ela traz muitos ensinamentos, assim
como a riqueza, mas a miséria e coisa dos homens: Como vamos ver mais adiante,
a miséria anterior do Zé Vitor era uma má opção feita por ele mesmo. Seguimos
caminhando e o Zé Vitor foi, aos poucos, abrindo o seu coração e me contando um
pouco da sua vida, de como amava o seu carrinho e de como este “burrinho de
madeira” tinha salvado a sua vida.
Disse-me ele, que há uns vinte
anos atrás a sua vida era muito diferente. Contou-me que era um alcoólatra, que
batia muito na esposa e nos filhos, que gastava quase tudo que ganhava com os
seus “bicos” em bebida, que era muito infeliz e que também fazia muito infeliz
a sua família.
Contou-me que um dia, quando
estava prostrado à porta do barraco, curtindo uma tremenda ressaca, um vizinho
da rua de cima o abordou e lhe propôs a doação de um velho carrinho de madeira
reserva (o carrinho atual, várias vezes reformado), que possuía no quintal da
sua casa. Contou-lhe que dava para tirar um “bom dinheirinho” catando lixo
reciclável e vendê-lo no depósito perto de casa. Como já estava cansado demais
da sua vida infeliz, resolveu aproveitar a oportunidade que a vida lhe oferecia.
Resumindo: após estes poucos mais
de vinte anos empurrando o seu carrinho, ele conseguiu criar os filhos, melhorar
a sua vida e a da sua mulher e se acha um privilegiado por ter uma vida tão
boa. Que se não fosse a caridade e a preocupação do seu vizinho e a ajuda de
Deus... e do carrinho, ele provavelmente já estaria morto e a sua família
espalhada pelas ruas, assim como tantas neste nosso “mundão de Deus”. Ah, e ele
ainda me disse, que por causa do exercício diário, empurrando o carrinho, ele
hoje é mais forte e mais saudável do que era há vinte anos, quando vivia
“garrado na maldita pinga”, sempre se sentindo fraco, por não dormir e nem se
alimentar direito.
Nós, erradamente, julgamos os
outros e as situações em que foram colocados pelo Carma, de acordo com a nossa
próprio opinião, com o nosso parco discernimento e as nossas próprias vivências,
achando que o que é bom e correto para nós, também o será para o outro; assim
como aquilo que é ruim e negativo para nós, certamente também o será para o
outro. Com os poucos subsídios e informações que temos, julgamos os outros de
acordo com aquilo que imaginamos deles, o que na maioria das vezes estará
errado, pois cada um tem o seu Dharma (objetivos da Alma para cada determinada
encarnação) e procura cumpri-lo da melhor forma possível, não da forma ideal,
devido aos seus próprios erros, falhas e idiossincrasias – limitações de todos
os seres humanos, ainda imperfeitos e em evolução.
Imaginemos menos e amemos
mais, confiando sempre na Justiça e no Amor do nosso Paizão Maior.
Sorria! – O Sorriso iguala as
pessoas.
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